Fernanda Gentil, desculpa pelos julgamentos e falta de empatia no mundo
Sobre essa polêmica aí com a
Fernanda Gentil (a jornalista da globo que postou um desabafo sobre
amamentação):
Li o depoimento dela e achei
tocante, verdadeiro, amoroso e corajoso. Sabemos o que é postar opinião numa
rede social hoje em dia, ainda mais sobre maternidade, ainda mais sendo uma
pessoa pública.
Li também inúmeras críticas
dizendo que ela fez um desserviço às mulheres, que o Brasil tem lactação
exclusiva de apenas 54 dias e que postar uma foto daquela era um incentivo à
introdução de fórmulas, etc.
Li ainda os comentários das
postagens. Alguns, muitos, de outras mulheres AGRADECENDO a ela por dizer aquilo.
Que se sentiam culpadas por não ter conseguido amamentar, que se sentiam
inferiores, que ler o relato foi libertador.
Imagina ser bombardeada desde que nasce sobre o quão mágico é ser
mãe. Que maternidade é dom inato, que é fácil, que é destino obrigatório.
Pensem nas propagandas e comerciais, onde a mãe é aquele ser angelical. Pense
nos cartazes de amamentação, onde um bebê suga facilmente um seio lindo e essa
mãe sorri apaixonada. Parece fácil. Parece mágico. Parece que nascemos pra
fazer aquilo.
(Alô Wanessa minha filha, tira essa roupa bege, solta esse cabelo de virgem Maria e vem pro nosso lado da maternidade de verdade. Fica a dica pro Ministério da Saúde: mães para além dos tons pastéis)
Agora imagina que na hora que
você recebe nas mãos aquele pacotinho definitivo chamado “filho” (e dá aquela
sensação de pânico, admitam), tu coloca ele no teu seio (grande, mudado, com
mamilos de outra cor. Às vezes rachados ou doloridos) e fuen fuen fuen,
não rola.
Não é um lego. Não é encaixe automático.
A criança (muitas vezes) não
sabe. A mãe também não. Como assim? Não é algo instintivo, natural, espiritual?
Não, não é. Assim como parir e maternar esse ser para o resto da vida também não.
Imagino a frustração dessa
mulher. A dor. A culpa. A sensação de fracasso.
Aqui Miguel nasceu sem saber mamar. Eu
tinha leite que jorrava, mas fui orientada ainda no hospital a dar leite em pó no
copinho. Foram três dias horríveis. Meu peito empedrando (tive febres e delírios mó onda).
De três em três horas lá estava eu com o copinho. Era uma
sujeira, um trabalho e uma impotência imensa.
Tudo mudou quando procuramos um
banco de leite. Com muita disposição, esforço e perseverança saí de lá
amamentando meu filho. A primeira mamada dele durou umas 2 horas, sério. Aí sim
foi lindo (pra mim).
Ele mamou até os dois anos (pra quem não sabia mamar néééé?). Uma experiência incrível.
Tenho muita saudade de amamentar.
Recebi felicitações por tê-lo amamentado
exclusivamente até os 6 meses e me questionei o porque. Já enxergava a amamentação com outros olhos. Era minha obrigação
enquanto mãe. Amamentar não é um ato de amor. Amamentar é oferecer o melhor
alimento para seu filho. Um alimento nutritivo e poderoso, mas um alimento. Não
tem a ver com sentimento.
Uma mãe adotiva por acaso não ama
seu filho? O pai? Alguma que decida ou não possa amamentar? E as mães que
precisam desmamar seus filhos para voltar ao trabalho?
Precisamos desassociar
amamentação de ato de amor.
Primeiro porque aí geramos um batalhão de mulheres
que acham que amamentar é simples e automático (e não, não é. Precisa de informação,
suporte e esforço, além do desejo, é claro) e depois há aquelas que se sentirão
um tanto mais fracassadas e culpadas por não terem conseguido amamentar, como se
amassem menos por isso.
Vamos conversar sobre
essa maternidade cor de rosa que nos pintam. Vamos nos livrar aos poucos de um peso milenar em nossas costas. E não é um vida sem culpa que busco, é uma maternidade real, para ser consciente e inteira.
É por isso que fiz esse post,
pra dizer que amamentar não é amar. Amar é um sentimento. Amamentar é só
alimentar. Vínculos se constroem de várias formas e eu concordo com a Fernanda
Gentil: segurando uma mamadeira também é possível olhar nos olhos.
Não estou fazendo apologia ao
não-aleitamento materno. Aqui mesmo já me dediquei a escrever diversas vezes sobre os benefícios
da amamentação, também já mostrei o quanto foi uma experiência
maravilhosa pra mim e que dedico parte da minha vida em militar nessa coisa
de maternidade ativa. Mas se queremos mesmo empoderar mulheres precisamos sair
dessa redoma sentimental/biológica e ir para o lado da informação, da busca por
uma rede de apoio, da critica ao sistema que nega direitos, do sistema de saúde
que incentiva o oposto do que acreditamos. Aí sim. Mulheres informadas jamais
serão lesadas.
(E ainda queria falar sobre as mulheres informadas, mas que simplesmente DECIDIRAM não parir, não amamentar ou não fazer qualquer coisa que a sociedade espera de uma dita boa mãe. Essas precisam do nosso respeito e não do nosso julgamento)
(E ainda queria falar sobre as mulheres informadas, mas que simplesmente DECIDIRAM não parir, não amamentar ou não fazer qualquer coisa que a sociedade espera de uma dita boa mãe. Essas precisam do nosso respeito e não do nosso julgamento)
Mas enfim, precisamos sobretudo de mais
empatia. E-M-P-A-T-I-A. Fale comigo. A capacidade de se colocar na situação do outro.
A moça, a Gentil, não conseguiu amamentar. Pode ter sido mal amparada?
Sim. Estava mal informada? Com certeza. Leite seca? Não (casos raríssimos).
Talvez poderia ter escrito um depoimento “eu não consegui, mas tente você assim
ou assado”? Sim. Mas julgá-la ou falar em desserviço chega a ser cruel.
Do que adianta sermos ativistas
em prol da amamentação, do parto, da ocitocina se quando uma de nós compartilha
uma experiência dolorosa nos voltamos contra ela? Parece as pessoas que são a
favor da vida, mas só se essa vida for a do embrião, a das mulheres não.
Eu queria deixar um abraço pra
Fernanda, pra Flávia (minha amiga) e pra todas as mulheres que não conseguiram
amamentar. Quero me juntar a elas e lutar conjuntamente contra esse índice
absurdamente baixo de aleitamento materno no Brasil. Com certeza tem algo de
errado com o sistema, com elas não. Elas merecem nossos ouvidos, nosso colo,
nosso apoio.
Vamos acabar de vez com essa
falta de solidariedade feminina. E também com a romantização da maternidade.
Seguimos aí na vida real. Com
nossos peitos ou nossas mamadeiras.
Em tempo: Falei de amamentação Aqui, Aqui , Aqui , Aqui e Aqui
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