terça-feira, 6 de outubro de 2015

Amamentação: precisamos falar sobre empatia e maternidade cor de rosa





 Fernanda Gentil, desculpa pelos julgamentos e falta de empatia no mundo 

Sobre essa polêmica aí com a Fernanda Gentil (a jornalista da globo que postou um desabafo sobre amamentação):

Li o depoimento dela e achei tocante, verdadeiro, amoroso e corajoso. Sabemos o que é postar opinião numa rede social hoje em dia, ainda mais sobre maternidade, ainda mais sendo uma pessoa pública.

Li também inúmeras críticas dizendo que ela fez um desserviço às mulheres, que o Brasil tem lactação exclusiva de apenas 54 dias e que postar uma foto daquela era um incentivo à introdução de fórmulas, etc.

Li ainda os comentários das postagens. Alguns, muitos, de outras mulheres AGRADECENDO a ela por dizer aquilo. Que se sentiam culpadas por não ter conseguido amamentar, que se sentiam inferiores, que ler o relato foi libertador.

Imagina ser bombardeada desde que nasce sobre o quão mágico é ser mãe. Que maternidade é dom inato, que é fácil, que é destino obrigatório. Pensem nas propagandas e comerciais, onde a mãe é aquele ser angelical. Pense nos cartazes de amamentação, onde um bebê suga facilmente um seio lindo e essa mãe sorri apaixonada. Parece fácil. Parece mágico. Parece que nascemos pra fazer aquilo.


(Alô Wanessa minha filha, tira essa roupa bege, solta esse cabelo de virgem Maria e vem pro nosso lado da maternidade de verdade. Fica a dica pro Ministério da Saúde: mães para além dos tons pastéis)


Agora imagina que na hora que você recebe nas mãos aquele pacotinho definitivo chamado “filho” (e dá aquela sensação de pânico, admitam), tu coloca ele no teu seio (grande, mudado, com mamilos de outra cor. Às vezes rachados ou doloridos) e fuen fuen fuen, não rola. 

Não é um lego. Não é encaixe automático. 

A criança (muitas vezes) não sabe. A mãe também não. Como assim? Não é algo instintivo, natural, espiritual? Não, não é. Assim como parir e maternar esse ser para o resto da vida também não.

Imagino a frustração dessa mulher. A dor. A culpa. A sensação de fracasso.

Aqui Miguel nasceu sem saber mamar. Eu tinha leite que jorrava, mas fui orientada ainda no hospital a dar leite em pó no copinho. Foram três dias horríveis. Meu peito empedrando (tive febres e delírios mó onda).

De três em três horas lá estava eu com o copinho. Era uma sujeira, um trabalho e uma impotência imensa.

Tudo mudou quando procuramos um banco de leite. Com muita disposição, esforço e perseverança saí de lá amamentando meu filho. A primeira mamada dele durou umas 2 horas, sério. Aí sim foi lindo (pra mim).

Ele mamou até os dois anos (pra quem não sabia mamar néééé?). Uma experiência incrível. Tenho muita saudade de amamentar.

Recebi felicitações por tê-lo amamentado exclusivamente até os 6 meses e me questionei o porque. Já enxergava a amamentação com outros olhos. Era minha obrigação enquanto mãe. Amamentar não é um ato de amor. Amamentar é oferecer o melhor alimento para seu filho. Um alimento nutritivo e poderoso, mas um alimento. Não tem a ver com sentimento.

Uma mãe adotiva por acaso não ama seu filho? O pai? Alguma que decida ou não possa amamentar? E as mães que precisam desmamar seus filhos para voltar ao trabalho?

Precisamos desassociar amamentação de ato de amor. 

Primeiro porque aí geramos um batalhão de mulheres que acham que amamentar é simples e automático (e não, não é. Precisa de informação, suporte e esforço, além do desejo, é claro) e depois há aquelas que se sentirão um tanto mais fracassadas e culpadas por não terem conseguido amamentar, como se amassem menos por isso.

Vamos conversar sobre essa maternidade cor de rosa que nos pintam. Vamos nos livrar aos poucos de um peso milenar em nossas costas. E não é um vida sem culpa que busco, é uma maternidade real, para ser consciente e inteira.

É por isso que fiz esse post, pra dizer que amamentar não é amar. Amar é um sentimento. Amamentar é só alimentar. Vínculos se constroem de várias formas e eu concordo com a Fernanda Gentil: segurando uma mamadeira também é possível olhar nos olhos.

Não estou fazendo apologia ao não-aleitamento materno. Aqui mesmo já me dediquei a escrever diversas vezes sobre os benefícios da amamentação, também já mostrei o quanto foi uma experiência maravilhosa pra mim e que dedico parte da minha vida em militar nessa coisa de maternidade ativa. Mas se queremos mesmo empoderar mulheres precisamos sair dessa redoma sentimental/biológica e ir para o lado da informação, da busca por uma rede de apoio, da critica ao sistema que nega direitos, do sistema de saúde que incentiva o oposto do que acreditamos. Aí sim. Mulheres informadas jamais serão lesadas. 

(E ainda queria falar sobre as mulheres informadas, mas que simplesmente DECIDIRAM não parir, não amamentar ou não fazer qualquer coisa que a sociedade espera de uma dita boa mãe. Essas precisam do nosso respeito e não do nosso julgamento)

Mas enfim, precisamos sobretudo de mais empatia. E-M-P-A-T-I-A. Fale comigo. A capacidade de se colocar na situação do outro. 

A moça, a Gentil, não conseguiu amamentar. Pode ter sido mal amparada? Sim. Estava mal informada? Com certeza. Leite seca? Não (casos raríssimos). Talvez poderia ter escrito um depoimento “eu não consegui, mas tente você assim ou assado”? Sim. Mas julgá-la ou falar em desserviço chega a ser cruel.

Do que adianta sermos ativistas em prol da amamentação, do parto, da ocitocina se quando uma de nós compartilha uma experiência dolorosa nos voltamos contra ela? Parece as pessoas que são a favor da vida, mas só se essa vida for a do embrião, a das mulheres não.

Eu queria deixar um abraço pra Fernanda, pra Flávia (minha amiga) e pra todas as mulheres que não conseguiram amamentar. Quero me juntar a elas e lutar conjuntamente contra esse índice absurdamente baixo de aleitamento materno no Brasil. Com certeza tem algo de errado com o sistema, com elas não. Elas merecem nossos ouvidos, nosso colo, nosso apoio.

Vamos acabar de vez com essa falta de solidariedade feminina. E também com a romantização da maternidade.

Seguimos aí na vida real. Com nossos peitos ou nossas mamadeiras. 

Em tempo: Falei de amamentação  Aqui,   Aqui , Aqui , Aqui e Aqui

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